Era terça-feira, abafada, com o ar parado como chumbo. Marcos disse ao chefe que visitaria um cliente, desligando o seu celular logo ao entrar em seu carro. Juliana saiu do escritório apressada, inventando uma audiência de última hora. O destino era sempre o mesmo: um motel discreto na rodovia e próximo à cidade. O gerente já os conhecia, não fazia perguntas. Apenas entregou a chave do Quarto 17.
O quarto estava igual a todas as outras vezes: lençóis esticados, espelho redondo sobre a cama, cheiro de desinfetante barato tentando encobrir algo mais antigo. Mas, enquanto se entregavam ao desejo, o ambiente começou a mudar.
A lâmpada piscava em intervalos estranhos. O rádio antigo chiou até formar uma voz gutural, repetindo os nomes deles:
— Mar… cos… Ju… lia… na…
O frio, de repente, veio gélido como um túmulo aberto. Juliana sentiu arranhões subirem-lhe pela nuca. Marcos tentou se levantar, mas os lençóis o agarraram, ásperos, quase cortantes. No espelho não apareceram os seus reflexos, mas sim dois corpos sem rosto, contorcendo-se em prazer carnal grotesco. Na sequência, o espelho se espatifou em muitos pedaços que foram espalhados pelo quarto.
O último som que ouviram foi um estalo seco como ossos quebrando. Depois, silêncio.
Na manhã seguinte, o casal já deveria ter ido embora, mas o carro ainda estava lá. O relógio marcava 9:00h horas.
A camareira bateu à porta, aguardou, bateu mais uma vez e, finalmente, resolveu abrir a porta com a sua chave mestre …. Soltou um grito!!! O quarto estava arrumado — cama feita, espelho intacto, travesseiros no lugar. Sobre os lençóis, lado a lado, estavam Marcos e Juliana. Frios, imóveis, olhos abertos. Os corpos exibiam marcas brutais: arranhões profundos nos braços e coxas, pulsos dilacerados como por algemas incandescentes, o peito de Marcos afundado por dedos invisíveis, o pescoço de Juliana cortado por sulcos vermelhos até a clavícula.
A camareira correu em pânico, chamando o gerente. Mas, quando voltou com ele, o choque foi ainda maior: os corpos estavam em outras posições: Marcos agora estava sentado, recostado contra a cabeceira, a cabeça tombada para o lado; Juliana jazia ao pé da cama, de bruços, como se tivesse sido arrastada. Os lençóis, no entanto, permaneciam perfeitamente esticados, sem uma única ruga.
O gerente chamou a Polícia e informou que o casal havia entrado na tarde anterior, mostrando o registro. As câmeras indicavam que o carro não saiu do estacionamento a noite inteira, mas nada mais. Nenhum movimento, ninguém estranho ou suspeito entrando ou saindo.
Um dos policiais, por sua vez, disse ao gerente que Marcos e Juliana estavam sendo procurados, pois a esposa e o marido de ambos haviam registrado o sumiço deles.
O laudo de necropsia não encontrou explicação. As diversas feridas não correspondiam a nenhuma arma e não havia sangue espalhado. Apenas os corpos que mudaram de posição pela segunda vez, como se fossem manipulados por mãos invisíveis.
O Quarto 17 foi interditado, mas alguns funcionários alegaram que vez ou outra a porta se abriu e, nessas horas, o espelho do teto acima da cama mostrava algo além do vazio — reflexos que sorriam, enquanto um rádio antigo sussurrava:
— Mar… cos… Ju… lia… na…
