O SEQUESTRO

            19:00h. Ninguém a buscou na escola. As aulas terminavam sempre às 18h. Ninguém aos quais me refiro seriam os seus pais. Divorciados há pouco tempo após uma sangrenta batalha litigiosa, confundiram-se quanto ao dia de cada um buscá-la. Não parece ter sido adequada àquela decisão judicial quanto à forma da guarda compartilhada de Janaína, filha única e ainda adolescente. Ela vinha se dividindo todos os dias entre as duas casas do ex-casal. E, a casa do pai, ainda estava muito improvisada. Na sala havia um sofá, algumas cadeiras, uma pequena mesa de centro e uma televisão que trouxe com ele. Quando Janaína ia pra lá, seu pai dormia no sofá, liberando-lhe a cama.

Enfim, esqueceram-se completamente dela, mas, aos 15 anos, já tinha autorização para sair sozinha da escola, caso quisesse. E ela quis. Cansou-se de esperar, saiu à rua, virou a esquerda e caminhou em direção à parada de ônibus a duas quadras da escola.

21h. Tocou o telefone e um número desconhecido apareceu no mostrador. Mesmo assim, a mãe de Janaína atendeu. Quinhentos mil reais era a pedida. O sequestro havia sido anunciado. Após alguns gritos e choros, o sequestrador passou as instruções de praxe: não falar nada à Polícia e levar o dinheiro numa sacola no máximo até às 12h do dia seguinte em local combinado. Lá, alguém pegaria a sacola e a menina seria solta. E desligou.

A partir daí, foi um inferno! Ela ligou para o seu ex-marido e relatou o ocorrido, após tê-lo xingado e o ofendido, pois era ele quem deveria ter buscado Janaína. Ambos sabiam não ter toda aquela quantia em suas contas. Talvez, se vendessem os seus carros, mas não seria o suficiente e também não tempo, é claro. Precisariam pedir dinheiro emprestado.

A separação do casal foi horrível. Ela o botou para fora de casa quando descobriu em mensagens do seu celular a traição com a sua melhor amiga. Não bastasse isso, essa amiga era a madrinha de Janaína e freqüentava a casa deles como se fosse da família. A menina assistiu toda aquela tragédia, as brigas, as ofensas e até os tapas desferidos no rosto do seu pai. A essas alturas, Janaína estava relegada a último plano e seus pais já não tinham conhecimento de sua vida social, de seus amigos, de suas programações…       

22h. O telefone tocou novamente. A essas alturas, os pais de Janaína já estavam juntos. Viram o número no mostrador que, logo após, confirmaram ser de um orelhão público local. O sequestrador queria ter certeza de que tudo andava como determinado e também reforçar a ameaça de que a menina seria morta caso não o obedecessem. Os pais exigiram falar com ela antes de qualquer coisa. O telefone foi colocado próximo de Janaína e ela só teve tempo de chamar pela mãe e chorar. Em seguida, o sequestrador assumiu novamente o comando e ouviu do pai de Janaína que eles não tinham todo aquele dinheiro. Foi o que bastou para escutarem um barulho e os gritos da menina, parecendo-lhes que ela teria sido agredida.

– Não! Deixe nossa filha em paz, gritou o pai. 

– Vamos conseguir o dinheiro!  Alô, alô …. o telefone foi novamente desligado.

23h. O telefone tocou e o número no mostrador era outro:

– Vocês querem de volta esta pirralha em pedaços?

– Não faça nada com ela! Nós vamos conseguir o dinheiro!

– Ótimo! Se vocês se atrasarem um minuto, não a verão nunca mais!

Correria. Ambos, cada um por si, começaram a telefonar para alguns parentes e amigos e pediam dinheiro emprestado, dizendo que precisavam com urgência para a manhã do dia seguinte e que devolveriam dentro de uma semana no máximo, sem explicarem a situação.

9h. Ambos se preparavam para ir ao Banco onde tinham contas. Pelo site, haviam verificado que, juntos, somavam uns 300 mil, além de uma aplicação de 100 mil na conta do pai, mas com carência para saque. Assim, ainda faltavam-lhe 200 mil, mas já teriam a garantia de levantar toda aquela soma até o horário da entrega.

Mas a mãe de Janaína, sem que o seu ex-marido soubesse, havia contado tudo ao seu tio, um Delegado de Polícia, e, inclusive, ele já estava se preparando para seguir ao local da troca a fim de fazer campana junto com mais alguns policiais muito bem armados. Assim, o casal, após movimentar várias pessoas e reunir todo o dinheiro exigido, chegou àquela praça uns quinze minutos antes do horário ajustado. Ao meio-dia em ponto, policiais disfarçados e espalhados pelos arredores, nada aconteceu e ninguém apareceu. O resgate fora frustrado! Por quê? O pai não entendia; estava apavorado e indignado, mas a mãe suspeitou que a Polícia fora descoberta. Retornaram juntos para a casa da mãe após mais de uma hora de espera.

16h. O telefone tocou mais uma vez e, agora, já grampeado pela Polícia. A mãe atendeu.

– Se querem a filha de vocês viva, agora é um milhão!

Nesse momento, Janaína entrou em casa e, aos gritos, disse para os seus pais ter escapado, após dormir na casa de um namorado que sequer eles sabiam existir.            

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *