O eco dos gritos ainda vivia dentro dela. Às vezes, de madrugada, soava nítido — como se o público ainda estivesse lá, com celulares erguidos e olhos brilhando. Verona fechava os olhos e ouvia: “Mais uma!”.
Mas os aplausos não eram de hoje. Fazia dois anos desde que ela entrara no palco pela última vez — e tropeçara, com as pupilas dilatadas, a fala arrastada e o olhar perdido. A imagem, transmitida ao vivo para milhões, correu o mundo antes que seu corpo atingisse o chão.
Naquele dia, Verona era manchete. No seguinte, piada. E, logo depois… silêncio.
Os cartazes nas ruas foram arrancados. As rádios pararam de tocar suas músicas. Os seguidores nas redes sociais evaporaram em massa — não por esquecimento, mas por repulsa. Verona se tornara, para muitos, o retrato da decadência.
— “Ela teve tudo e jogou fora”, diziam comentaristas de TV.
— “Mais uma vítima de si mesma”, respondiam nos fóruns da internet.
Verona, agora, morava num apartamento pequeno, na periferia da cidade. O piano de cauda fora vendido para pagar clínicas de reabilitação — nenhuma delas suportada até o fim. A cada recaída, mais portas se fechavam.
Um dia, o produtor que a descobrira — e que já não atendia seus telefonemas havia meses — mandou um áudio seco:
— “A gente tentou. O público não quer mais você.”
Mas naquela noite chuvosa de outubro, algo mudou. Ao abrir uma caixa antiga, encontrou um caderno de letras rabiscadas, manchadas por café e lágrimas. Eram canções que nunca chegaram aos palcos, escritas quando ainda acreditava que a música era maior que tudo.
Sentou-se, abraçou o seu violão gasto e, com voz rouca e falha, cantou. Não havia holofotes. Não havia aplausos. Apenas ela, a chuva na janela e o som da própria alma tentando não morrer.
No dia seguinte, impulsivamente, gravou um vídeo. Sem maquiagem. Sem efeitos. Sem produtores. Apenas a canção — triste, crua, verdadeira. Postou nas redes.
As primeiras horas foram um deserto de visualizações. Mas, lentamente, um comentário apareceu. Depois outro. E outro.
— “Eu lembro de você.”
— “Ainda canta como ninguém.”
— “Dessa vez… parece real.”
Verona não sabia se aquilo era um recomeço ou apenas uma lembrança bonita antes do fim. Não havia contratos batendo à porta. Não havia manchetes exaltando seu nome.
Naquela noite ela cantou mais um a vez para si mesma. Para a solidão.
Do lado de fora, a cidade dormia indiferente.
E talvez — só talvez — um dia alguém a ouvisse de novo.