Matador de aluguel com orgulho; essa era a sua principal atividade. Contabilizava sete tiros, sete corpos. Sempre certeiro e sem desperdícios. Porém, no último serviço errou o tiro e a encomenda fugiu.
Apoiou com suavidade o dedo indicador direito no gatilho, firmou o pulso com a outra mão, fechou o olho esquerdo, fez a pontaria e disparou. O projétil passou rente à cabeça do alvo e penetrou na parede. Não se perdoara pelo fracasso; nem ele e nem o seu furioso contratante, um homem rico e acostumado a pagar para ter tudo o quanto quisesse. Teria pago a metade; a outra, somente após a apresentação da fatura.
Ainda garoto, talvez aos quinze, Trajano matara o primeiro. Não, não foi um trabalho, mas sim uma vingança! – O cara mereceu – disse ele. O sacana havia quebrado a sua perna durante um jogo de futebol de várzea. – Foi de sacanagem! Recuperado da quebradura, Trajano emboscou a presa e lhe meteu uma azeitona quente bem no meio dos olhos. Eliminado o problema, gostou. A partir daí, passou a eliminar os problemas dos outros em troca de grana. E faturava alto!
Um clássico: menino negro e pobre, mãe puta e pai desconhecido. Virou-se como deu. Trabalhou desde menino cedo num mercadinho próximo à favela onde morava. Organizava os produtos nas prateleiras, carregava as compras para os fregueses e até pelo caixa passou. Era de confiança. Sem que soubesse, seu Nestor, o dono daquele estabelecimento, era um dos principais clientes de sua mãe.
– Faz de tudo aquela mulata gostosa! Contava seu Nestor aos amigos; por isso, deu empregopra ajudaro moleque. Trajano aprendeu a fazer contas. Mas não resistiu à tentação da galerado tráfico. Começou como mula; esse foi o seu batizado no crime.
Nunca frequentara colégio a não ser para assaltar justamente na noite seguinte à matrícula dos alunos. – Era uma escola de branquelosricos, disse. – Valeu o trampo! Dividiu a grana com mais dois comparsas, mas ficou com a maior parte porque era dele o revólver; havia comprado no morro e precisava reaver o investimento.
Foi em cana duas vezes: a primeira, por conta do envolvimento com o pó; ficou pouco tempo preso porque era primário e de bons antecedentes. A segunda, por assalto a mão armada. Dessa última, aproveitou a rebelião no presídio e fugiu.
Da matança, nunca fora descoberto. Afora a cagada desse último serviço, Trajano mostrava grande competência. Tomou tiro da polícia, mas foi de raspão. Era um cara de sorte. Hoje, aos vinte e sete, fugia também daquele que lhe contratara para o serviço fracassado.
Aquela bronca precisava ser resolvida; era uma questão de reputação!
Procura daqui e dali; nada do alvo. – Escafedeu-se, o sacana, dizia o matador.
O alvo era um padre. Nunca havia apagado um religioso. A maior autoridade encomendada e abatida por ele tinha sido um safado candidato a vereador da cidade vizinha.
– Que serviço mole! Afirmou; – política é um ótimo negócio; tô a fim de me especializar.
Logo após ter sobrevivido ao tiro, o padreco pediu urgente transferência daquela cidade. Um coroinha de merda da Igreja, depois de bem apertado, contou que o religioso havia se mandado pra uma Igreja em São Paulo, mas não sabia qual….
– Cacete! Quantas igrejas têm por lá?Da rodoviária, e com um mapa da cidade em mãos, partiu Trajano em busca do padre. Sem descanso, escarafunchou cada uma das igrejas da cidade.
– Puta cidade grande, meu! O que será que esse padre de merda andou fazendo pra se encontrar com Deus antes da hora?
Nunca se preocupara com isso; os motivos do trabalho pouco importavam. Ficou sabendo por acaso que o representante de Deus havia furnicado com a filha caçula daquele ricaço que o contratara. – Porra, mas só por isso?
Jamais havia desistido de uma missão, mas aquela já estava passando dos limites.
– Onde tu te enfiou, padreco?
Precisava dar uma prova do serviço concluído. Essa era a regra do negócio; serviria até cabeça na bandeja pra contentar o cliente.
Puto da vida equasesem esperanças em localizar o sacerdote comedor de meninas, Trajano teve uma grande ideia para solucionar o problema e também para garantir o seu bom nome no mercado. Usou a última grana que lhe sobrara, comprou uma bonita imagem de gesso da Virgem Maria e pagou para publicar num jornaleco de bairro a seguinte notícia:Assalto e morte na Igreja. Após matar com três tiros o padre R.J.M., o assassino revirou tudo, levou o dinheiro recolhido dos fiéis e uma imagem de gesso da Virgem Maria


